sábado, 29 de agosto de 2009
Discos de cabeceira
LEGIÃO URBANA- V (1991)
Esse deveria entrar, sem dúvida alguma, na categoria Discos que mudaram minha vida. Piegas? Exagero? I don´t think so. Esse disco realmente mudou algo. Antes dele, eu estava completando a transição do moleque fã de Asa de águia para o moleque fã de Rock n´Roll.
E o que eu ouvia eram coisas pesadas - no som ou na temática escrachada - Os Mamonas, Raimundos, bandas de hardcore e punk.
E aí veio esse disco.
Totalmente oposto a tudo o que eu ouvia. Sonoridade calma, serena, melancólica- e algumas músicas com temáticas não menos pesadas, porém mais sérias,como solidão e drogas, por exemplo.
Esse disco foi realmente concebido pela banda para ser lento e melancólico, para causar estranheza àqueles que os acompanhavam desde o primeiro disco e que já haviam inclusive absorvido a sonoridade já serena do antecessor As Quatro Estações,de 1989. Há, no encarte, duas frases que explicam o conceito ali explorado: a primeira,creditada a Brian Jones, falecido ex-guitarrista dos Rolling Stones: "Such psychic weaklings has western civilization made of so many of us - Tão fracos da psiquê(ou da alma) a civilização ocidental fez de tantos de nós". A outra era "bem vindos aos anos 70!". Aí se explicam os conceitos sonoros(flertes com progressivo, estilo típico dos 70) e temáticos das canções(melancolia, desolação).
Os rompantes de progressividade estão presentes na primeira faixa, "Metal contra as nuvens", precedida por uma cantiga de amor portuguesa do século XIII, que dava pistas para a temática meio medieval de "Metal". Com 11 minutos, essa música merece um tratado, pois vários são os temas abordados nela. Solidão(temática que permeia o disco todo) e desilusão com o país, então em plena Governo Collor, posto metaforicamente nas entrelinhas - "quase acreditei na sua promessa, e o que vejo é fome e destruição, perdi a minha cela e a minha espada, perdi o meu castelo e minha princesa".Tudo como se fosse a saga de um cavaleiro medieval, mas na verdade era real situação daquele momento que estava sendo cantada. No fim, algumas mensagens positivas:"não me entrego sem lutar, tenho ainda coração, não aprendi a me render- que caia o inimigo então. Tudo passa, tudo passará" ou "vamos viver, temos muito ainda por fazer. Não olhe pra trás - apenas começamos." Afinal, nem tudo é pessimismo e sempre há uma luz.
Depois, a viajante "Ordem dos Templários", instrumental, e em seguida, "A Montanha Mágica", a tal que fala de drogas. O que dizer de versos como "minha papoula da índia, minha flor da Tailândia, és o que tenho de suave - e me fazes tão mal". A tentativa de desintoxicação:"deixa o copo encher até a borda, eu quero um dia de sol num copo d´agua", referência ao alcoolismo do cantor.
Há mais refrências à Era Collor em "Teatro dos Vampiros" - "os meus amigos todos estão procurando emprego", que hoje em dia poderia virar 'os meus amigos todos estão prestando concursos públicos". Temática atualíssima, basta só fazer as devidas alterações...
Uma música mais "animada", "Sereníssima", seguida de "Vento no Litoral", que Arthur Dapieve, biógrafo de Renato Russo, descreve como "nunca uma caminhada à beira-mar havia sido tão cinza, tão dolorosa". Ao ouvir a letra, dá pra imaginar o cenário: fim de tarde, numa praia qualquer, alguém caminhando só, aquele vento gelado de chuva por vir, o céu cinzento...Dor-de-cotovelo total. Quem nunca se sentiu daquele jeito atire a primeira pedra...
Pra contrabalançar, uma música mais levinha, "O mundo anda tão complicado", que fala de um casal que está começando uma vida a dois. Como não há uso de artigos ou quaisquer palavras que caracterizem os sujeitos, pode ser qualquer casal, até mesmo Eduardo e Mônica, de outra canção da banda. Por último, L`age Dor, com guitarras raivosas e ótimos riffs- pra quem acha que o Dado Villa Lobos não tocava nada, ouça com atenção o trabalho de guitarras dessa faixa... Mais uma vez, referências a drogas e o esforço para livrar-se delas.
Várias sãos as referências à vida pessoal do cantor. Porém, apesar disso, dá pra se identificar bastante em algum momento com alguma dessas canções, pela forma com que as letras são construídas - um trunfo do autor, que, com isso, conseguiu e ainda consegue, mesmo após sua morte, angariar vários fãs,como aquele moleque de 14 pra 15 anos(eu), fã dos Mamonas e dos Raimundos e que só queria saber de ouvir som rápido e pesado.
Por que esse disco me mudou? pelo fato de começar a apreciar letras mais elaboradas, com certo lirismo, e sonoridades menos raivosas, mais serenas. Não sei se esse disco me transformou num ser humano melhor, mas com certeza me transformou num ouvinte melhor de música.
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Eu sempre imaginei Vento no Litoral como uma caminha noturna pelas pedras na beira de uma praia...
ResponderExcluir